Arquivo mensal: junho 2016

A internet é uma ferramenta empoderadora, aceitem

RosieTech

Por NANA SOARES
Blog Estadão, 23 junho 2016 | 13:34

Na quarta-feira, 22, o Facebook e o Instagram lançaram o programa #ElaFazHistória, que pretende celebrar e incentivar o empreendedorismo feminino (mais informações no fim do post). Estive no lançamento em São Paulo e não pude deixar de refletir sobre o espaço que nós, mulheres, ocupamos na internet e como nos apropriamos dela.

Em um mundo machista e profundamente desigual para homens e mulheres, a rede reproduz várias dessas desigualdades e ainda cria contextos próprios de discriminação e violência. As consequências, no entanto, não se limitam ao virtual e afetam (e muito) nosso cotidiano.

Diversas pesquisas mostram que as matérias feitas por mulheres recebem mais comentários violentos. São inúmeros os casos de jornalistas e/ou ativistas que, ao se manifestarem contra a violência de gênero recebem ameaça como resposta – como Juliana de Faria e Nana Queiroz, que levantaram bandeira pelo fim do assédio em espaços públicos e da cultura do estupro e foram ameaçadas de morte e de violência sexual. Quase todas as feministas que atuam na internet recebem ataques e ameaças cotidianas. Mesmo neste blog não faltam leitores que se sentem muito confortáveis em ofender e atacar pessoalmente quando não concordam com uma opinião.

Não para por aí: as mulheres são perseguidas e assediadas em diversas comunidades; são e têm suas fotos e vídeos íntimos divulgados sem autorização com o intuito de humilhá-las;
as gamers e há levantamentos indicando que Em suma, a internet pode ser um ambiente hostil para as mulheres. Mas felizmente a história não se resume a isso, e a rede também é
utilizada por nós como instrumento de empoderamento e de libertação. Há quem diga até que vivemos uma quarta onda do feminismo, caracterizada pelo ativismo e empoderamento no meio virtual.

São crescentes os grupos de apoio no Facebook com o intuito de trocar experiências e de promover práticas libertadoras como a contracepção não-hormonal e a aceitação de cabelos crespos. Há também um aumento consistente de mulheres que querem aprender a produzir tecnologia, um campo promissor e ainda majoritariamente masculino. No campo dos negócios, há iniciativas para formar redes de mulheres que se desenvolvem juntas, das quais destaco a Rede Mulher Empreendedora e a Maternativa.

A internet já é parte da vida de uma parcela considerável da nossa população (são 105 milhões de brasileiros no Facebook, 35 milhões no Instagram, e o Brasil é um dos principais mercados do Twitter), nada mais natural do que utilizá-la a nosso favor. Seja para promover a autoestima, valorizar o nosso negócio ou nos conectar com outras mulheres que passam por dilemas parecidos. A quantidade de insultos e ameaças que recebemos são um reflexo de como nossa simples existência incomoda uma sociedade machista. Online ou offline, ser mulher é resistir.

#ElaFazHistória

A campanha lançada pelo Facebook e pelo Instagram tem como objetivo celebrar ideias, contar histórias de negócios erguidos por mulheres e capacitar para inspirar outras mulheres a realizarem seus próprios projetos. A hashtag vai reunir depoimentos de mulheres contando suas histórias e homenagens a mulheres inspiradoras, todas reunidas no portal do programa.

O #ElaFazHistória inclui oficinas e debates nas cinco regiões do país para capacitar as empreendedoras. A primeira oficina acontece em Recife, no dia 1° de julho; agosto é a vez de Porto Alegre e Belém; Brasília em setembro e São Paulo em outubro.

A campanha também promoverá um prêmio para reconhecer histórias de empreendimento feminino. As inscrições nas três categorias se iniciarão no dia 1° de julho.

Disponível em: <http://goo.gl/jM4GjH>. Acesso em 23 jun. 2016.

 

Opinião: Não temos maturidade para o Facebook

Por RENATO ESSENFELDER
Blog Estadão, 20 junho 2016 | 15:18.
face-e1466464271154

Arte: loro verz (Estadão)

A rede virou um espelho de Branca de Neve moderno. Não é má em si, mas se alimenta de nosso mal profundo.
Está sempre a mostrar que alguém é mais bela do que você, mais rica do que você, mais feliz do que você… que não sabe lidar com isso.

»Não temos maturidade para o Facebook. Talvez a mais fantástica ferramenta de comunicação já criada: rápida, fácil, acessível, flexível. Você pode ter descoberto este texto pelo Facebook. E então pode comentá-lo, compartilhar; até filosofar, fazer destes bytes uma conversa de bar. Se não gostar, insista navegar: achará bilhões de outros textos pela rede, facilmente, e quem sabe o que mais.

É mais ou menos assim que a maioria dos meus colegas vê o Face. Incrível instrumento para compartilhar conteúdos, encontrar pessoas, estudar, conhecer, bater papo. A revolução pode não ser televisionada, como dizem, mas certamente será facebookeada.
Eu, no entanto, como naquele poema do Fernando Pessoa, eu torto e sem graça, o único que não é príncipe na tabacaria, tristemente discordo. O Facebook, as redes sociais em geral, poderiam ser uma maravilha emancipatória. Poderiam. Não são.

O que vi nestes anos de rede social, comparados à minha juventude préfacebook,
é desalentador. As crianças de dez anos já o sabem. A gente não tem coragem de “falar na cara”, mas, na frieza das teclas, espalha os maiores absurdos. Vomitam preconceitos, ódio,
incompreensão. A terrível inveja, o querer destruir aquilo que não se tem. A rotina.
Nas telas, sem filtros e sem empatia, cometemos os horrores que pessoalmente não ousaríamos.

Não temos maturidade para o Facebook. Num outro mundo, talvez, as coisas fossem diferentes. Gostaríamos de dialogar, discutir civilizadamente. Saberíamos usar a rede para outra coisa senão massagear nossos frágeis egos, perseguir implacavelmente uma
aprovação que não virá. Seríamos menos hipócritas, mais sinceros. Em outro mundo.
Neste, o que fizemos com as redes sociais? Espelho mágico de vaidade e ambições, o Facebook é um espelho de Branca de Neve moderno. Não é mau em si, mas se alimenta de nosso mal profundo. Um espelho deformado que está sempre a mostrar que alguém é
mais bela do que você, mais rica do que você, mais culta do que você, mais feliz do que você… que não sabe lidar com isso. Um alguém, claro, fantasmagórico, que só existe ali, no espelho.

Não importa, o efeito é o mesmo. Confrontados com um mundo de fantasia, liberamos as porções mais sombrias do ego. Espalhamos maçãs envenenadas por chats, mensagens, posts, vídeos, fotografias. Às vezes, um inocente morde. É pena – poderíamos ser tão
melhores, mas:
Não temos maturidade para o Facebook.«

 

Disponível em: http://vida-estilo.estadao.com.br/blogs/renato-essenfelder/nao-temos-maturidade-para-o-facebook/